quinta-feira, 26 de maio de 2011

OS MESTRES E A CANÇÃO

Estive no SESC Vila Mariana para assistir a gravação do DVD O Fim da Canção pelo Selo SESC, com nada mais nada menos que Zé Miguel Wisnik, Arthur Nestrovski, Luiz Tati e participação especial de Celso Sim.

Fazia muito tempo que os professores não se apresentavam. Eu particularmente adoro! Estava com saudades, mas a coisa mais interessante é perceber que a cada música, vai se construindo um novo sentimentono no coração e na cabeça uma outra idéia, totalmente oposta ao que sugere o título do espetáculo.
Sim, espetacular, é a palavra, um show poético, a canção mais viva do que nunca, gritando pra ser ouvida, se derramando, escorrendo, tomando conta do espaço.
Confesso que me preocupei ao saber que Celso Sim faria a participação especial, pois da útlima vez que o vi num show do Wisnick foi muito estranho, ele tentava a todo custo roubar a cena. Impossível!
Mas, dessa vez, tive uma grata surpresa, Celso Sim arrasou. Bonita voz, uma descoberta encantadora, uma alegria a mais no palco. Delícia!
Marcelo Jeneci também estava lá, com seu já eterno e mágico acordeão. Maravilhamento total. Revelação, um trabalho muito bonito, delicado, sensível.E a lindíssima canção Feito pra acabar em parceria com Wisnick é beleza pura.
Uma beleza ver uma nova geração de músicos e compositores trilhando os melhores caminhos.
Sergio Reze como sempre arrasador na bateria. Arrasador suave, delicado, mais uma sensibilidade à flor da pele.
Bem, ao que parece, a gente é feito pra acabar, assim como a canção e como a história... Tudo bem.... Enquanto isso, a música vive na voz dos nossos eternos professores e quando ela acabar, com certeza não estarei aqui pra ver!
Então deixo aqui a canção de Jeneci que simboliza o show, pra gente não esquecer... jamais!

Quem me diz
Da estrada que não cabe onde termina
Da luz que cega quando te ilumina
Da pergunta que emudece o coração
Quantas são
As dores e alegrias de uma vida
Jogadas na explosão de tantas vidas
Vezes tudo que não cabe no querer
Vai saber
Se olhando bem no rosto do impossível
O véu, o vento o alvo invisível
Se desvenda o que nos une ainda assim
A gente é feito pra acabar
A gente é feito pra dizer
Que sim
A gente é feito pra caber
No mar
E isso, nunca vai ter fim.

http://letras.terra.com.br/marcelo-jeneci/1777498/


sábado, 7 de maio de 2011

A casa que é obra e morada do artista

Tudo começou com uma armação de ferro feita para proteger as roseiras dos meninos que corriam daqui pra lá, de lá pra cá. Depois foram chegando as pedras e a paixão por cerâmica e pratos azuis. É com evidente alegria que ele relata a história da sua casa, quando tinha tanto pé de fruta, pé de maçã, pé de para-raio, pé de jabuticaba onde os passarinhos pousavam e se fartavam de tanto comer
Seo Estevão Silva da Conceição é um homem simples, era lavrador, plantava feijão, construía palhoças como casas de índio, uma pessoa cheia de sensibilidade, tornou-se artista. Seo Estevão sabe valorizar e produzir beleza. Há 16 anos atrás seu talento foi revelado numa matéria produzida pela Folha de São Paulo e daí em diante não paramos mais de nos encantar com o castelo – obra do Gaudí Brasileiro, como passou a ser chamado desde então.
No início ele chamou sua obra de Casa Enfeitada, talvez caracterizando uma primeira fase do seu extenso processo de produção quando ainda trabalhava muito com madeira e plástico descartável, hoje, talvez como segunda fase, sua obra é chamada Casa de Pedra.

Trata-se de um artista singular, pois não integra nenhum circuito, mas ao mesmo tempo, os apaixonados por sua obra se encarregam de veiculá-la em diferentes mídias, o que o tornou conhecido em todo o mundo, chamando inclusive a atenção da Fundação Gaudí, que o convidou para visitar em Barcelona a obra do grande artista espanhol.
Até aqui seo Estevão não conhecia o grande artista Antoni Gaudí (1852 – 1926), arquiteto catalão, não havia visto nenhuma fotografia do seu trabalho, por isso mesmo, surpreendeu-se ao se deparar com a magnífica obra, a imponente, grandiosa e eternamente em construção Sagrada Família (1926), a Casa Milá (1907) e principalmente o Parque Güell (1914) que em tudo o fez lembrar da sua casa enfeitada. A partir daí, Seo Estevão é sempre lembrado como um artista único que, mesmo sem ter conhecido Gaudí, desenvolveu um trabalho em completa sintonia com a estética do catalão.
Seo Estevão desenvolveu uma estética própria, diz que não é qualquer objeto que combina, as imagens de santos na sua obra são muitas, Santo Expedito, Nossa Senhora da Aparecida, Santa Rita, santo de todo tipo, todos juntos ali, quase um presépio contemporâneo. Ele explica que a imagem do santo é apenas um objeto estético, o santo mesmo não está ali, o santo está lá em cima, então não se pode misturar as coisas. Toda imagem é simulacro, a representação, não a coisa em si.

É emocionante ouvir a palavra do seo Estevão, quando perguntado sobre o que é ser artista pra ele, uma questão que ele responde com total consciência, como a principal descoberta de alguém que dedicou sua vida a construção do belo: “Um artista tem que ser delicado, tem que ter a consciência de que o que faz é arte” e talvez essa seja uma questão ética, quando o artista se responsabiliza pelo processo de construção da obra e vai além, sabe como compartilhar, a idéia, o processo, a obra.
Hoje, a casa de seo Estevão é visitada gratuitamente, dia e noite, principalmente por estrangeiros, a comunidade de Paraisópolis achava que aquele negócio era macumba, diziam que a casa era da bruxa, ninguém chegava perto, agora não, toda a vizinhança tem orgulho e quer entrar sim, é tanta gente, às vezes cansa, atrapalha o cotidiano da família...

Atualmente seo Estevão tem produzido belíssimos vasos e foi convidado para participar do projeto Vacas que foram produzidas por diferentes artistas e espalhadas pela cidade.
Atualmente seo Estevão trabalha como zelador num condomínio em Pinheiros e nos diz: Não se ganha muito com a arte. Temos que trabalhar para sustentar a arte!
Esse encontro com o ‘Gaudi Brasileiro’ se deu no SESC Belenzinho, na programação paralela da Mostra Cultural - Estética da Periferia – Arte e Cultura nas Bordas da Metrópole, no período de 5 a 8 de maio.
O encontro contou com a mediação de Rafael Franja Lima e a presença do fotógrafo Guma que produziu belas fotografias da Casa de Pedra de Seo Estevão e é autor do Projeto Moradas quando registrou diversas residências em Taboão da Serra e outras periferias com a finalidade de fugir aos clichês e estereótipos tão propagados pelos grandes veículos de comunicação que absolutamente não representam as pessoas com suas imagens.
No debate, discutimos um pouco essa noção de Estética da Periferia e concluímos que é muito complicado tratar no singular aquilo que se pode ser entendido no plural, afinal diante de tanta diversidade, não temos apenas uma estética representando as periferias, mas sim, muitas estéticas, cujo valor artístico precisa ser percebido e reconhecido, para romper com a lógica da arte e da cultura como ferramenta social.
A arte nas periferias deve ser entendida como a expressão de artistas que desenvolvem suas obras a partir de conceitos e estéticas próprias. Por isso, a Mostra Estética da Periferia pode sim contribuir para evidenciar a importância da produção de artistas que a partir de seus trabalhos subvertem a lógica preconceituosa que estereotipa a produção artística das periferias das grandes cidades.

Para terminar faço minhas, as palavras de dois grandes artistas que estiveram na programação paralela da Mostra no SESC Belenzinho:

“A periferia não é mais adjetivo. A periferia é verbo. E verbo é movimento, ação!” (Gog, rapper)

“Quem vai embora, não embolora!” (Edvaldo Santana)