domingo, 10 de abril de 2011

Cópia Fiel – Ficção ou Realidade?

Cópia Fiel é o mais recente filme de Abbas Kiarostami rodado fora do Irã. Embora seja um filme universal, é possível perceber características do cinema de Kiarostami em cada detalhe, no cuidado, na singeleza e principalmente na questão temporal, o tempo da existência, o tempo particular de cada um para viver uma história.
Trata-se do relacionamento entre um escritor inglês James Miller, interpretado pelo ator de óperas e barítono William Shimmell e uma mulher francesa dona de uma galeria de arte, interpretada pela espetacular Juliette Binoche que emociona pela entrega e competência com a qual abraça a personagem criando uma verdade emotiva que envolve toda a história.
Acho que vale chamar atenção para a pequena e singela participação da criança que interpreta o filho de Elle (Binoche) logo no início do filme, que embora muito pontual, abre as portas da incerteza e da dúvida que se construirão ao longo do filme.
A história se passa num vilarejo da Toscana, um lugar lindo que acolhe os personagens no seu fantástico jogo sentimental que coloca os espectadores em dúvida do começo ao fim. O filme é falado em francês, inglês e italiano, fator esse que indica a escolha de Kiarostami pela Itália como um possível lugar do encontro e das diferenças.
A ‘cópia’ como tema sugerido relaciona-se às reproduções de obras de arte, mas funciona no filme como metáfora para a questão dos relacionamentos. Além disso, coloca em dúvida o verdadeiro sentido da vida, aquilo que mais valorizamos, a questão da originalidade vista como realidade e o filme transita por esses pólos, a cópia, o original, a verdade, a mentira, a ficção e a invenção na vida.
O que está em questão é a necessidade que sentimos em definir cartesianamente o que é ficção e realidade, não podemos viver sem isso, acreditamos que as respostas estão em algum lugar num desses pólos, e qualquer coisa fora disso nos aflige! Mas para Kiarostami isso não importa, o que deve prevalecer é a atualidade dos sentimentos confusos e ambíguos que o filme provoca.
Cópia Fiel exige do espectador o despojamento da vida lá fora, nos obriga a fechar a porta das pequenas coisas cotidianas e nos entregarmos a história que se revela na sala escura, como num sonho, nos deixarmos levar e sentir... Mas o público pode perder essa nuance se continuar preocupado em desvendar o mistério...
Talvez por isso mesmo, não seja um filme tão fácil de fruir como deve ser... Como sempre Kiarostami nos desafia e repete a boa e velha lição, olhar para as pequenas coisas, perceber os detalhes, aprender a ouvir, e principalmente romper com a linearidade da vida, encarar as dúvidas, fugir aos estereótipos que destroem nossa sensibilidade.
Cópia Fiel precisa ser visto mais de uma vez, porque ainda somos uma sociedade embrutecida e embotada que não se permite tão facilmente viver a experiência da delicadeza, da beleza e do sonho proposta por Kiarostami em toda sua cinematografia.


Cópia Fiel (Copie Conforme). Direção: Abbas Kiarostami. Gênero: Drama (França-Itália-Irã/ 2011, 106 minutos).

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